Pouco após ser eleito papa em 2013, Jorge Mario Bergoglio enviou uma carta ao San Lorenzo para agradecer ao clube do coração pelas homenagens e demonstrações públicas de carinho, que parabenizavam o ilustre torcedor por assumir o comando da Igreja Católica.
Na mensagem endereçada ao Ciclón, Francisco recordou o time campeão argentino de 1946 e, em especial, citou uma das estrelas daquela equipe: “Aquele gol de Pontoni!”, escreveu o papa, referindo-se a René Pontoni, seu ídolo de infância e um dos maiores atacantes da história do San Lorenzo.
Revelado pelo Gimnasia y Esgrima de Santa Fe, o descendente de italianos logo impressionou nos torneios santafesinos, integrando a seleção regional. Era apelidado de Huevo (Ovo, em espanhol), alcunha que ganhou da própria família ao ajudar na coleta de ovos para abastecer o armazém familiar.
Em 1941, foi comprado por 12 mil pesos pelo Newell’s Old Boys, depois de negar propostas do Boca Juniors e do Peñarol, do Uruguai.
Pontoni considerava ter vivido no Newell’s o melhor momento físico e técnico de sua carreira. Com boas atuações pelo clube de Rosario, chegou à Seleção Argentina, estreando pela Albiceleste em um clássico contra o Uruguai e marcando dois gols na vitória por 4 a 1.
“É possível afirmar que ele rompeu o molde dos centroavantes. Porque não tinha apenas potência e pujança, mas também um futebol simples e redondo. De grande capacidade goleadora, é reconhecido como um dos melhores jogadores argentinos da história”, escreve Julio Macías no livro Quién es quién en la Selección Argentina, que traz dados e perfis de todos os atletas que já defenderam a seleção do país.
Quem percebeu esse talento goleador foi o San Lorenzo. Em 1945, o Ciclón pagou 100 mil pesos para contratar o atacante, um investimento alto que trouxe resultado imediato.
Ao lado de Armando Farro e Rinaldo Martino (com passagem discreta pelo São Paulo em 1953), formou um trio de ataque que seria recordado eternamente por torcedores do clube como o Terceto de Oro. Entre esses torcedores estava o próprio Jorge Mario Bergoglio.
Farro, Pontoni e Martino lideraram o time do bairro de Boedo em uma campanha irretocável no Campeonato Argentino de 1946, que terminou com o título nacional, o primeiro em uma década. O San Lorenzo marcou 90 gols em 30 partidas, com o trio responsável por 55 bolas na rede.
“Me perguntavam se eu, Martino e Farro combinávamos algo. E não. Falávamos pouco antes do jogo, mas as coisas saíam sozinhas. Eu sabia o que Farro ia fazer, Martino sabia como eu pensava, e eu adivinhava o que ele faria. Chega um momento em que de tanto conhecer os seus companheiros você pode jogar sem olhar”, descreveu Pontoni em entrevista à revista El Gráfico anos depois.
Francisco, já eleito papa, lembraria em entrevista à TyC Sports que compareceu a todos os jogos da equipe em casa, no Viejo Gasómetro, durante a campanha do título argentino. Fora de casa, disse ele, assistiu a somente uma partida, justamente o confronto em que René Pontoni faz o gol que Bergoglio recordaria na carta enviada ao San Lorenzo.
Tricampeão da Copa América com a Argentina em 1945, 1946 e 1947, Pontoni encerrou sua passagem pela seleção com a marca impressionante de 19 gols em 19 duelos — média de um gol por jogo.
Depois do brilho no San Lorenzo, o atacante se transferiu para o futebol da Colômbia, onde defendeu o Santa Fe. Após passagem pela Portuguesa em 1953, despediu-se do futebol no próprio San Lorenzo, em 1955. De acordo com a revista El Gráfico, anotou 132 gols ao longo de 212 partidas na carreira.
“O centroavante mais fino, elegante, harmonioso, sutil e brilhante de toda a história do futebol nacional”, escreveu o lendário jornalista argentino Juvenal nas páginas da El Gráfico.
Após pendurar as chuteiras, René Pontoni foi treinador por um breve período, mas se dedicou mesmo a uma pizzaria, La Guitarrita, que abriu com o ex-companheiro de seleção Mario Boyé.
Morreu em maio de 1983, aos 63 anos, vítima de ataque cardíaco, quatro décadas antes de Jorge Bergoglio se tornar Francisco e citar, em carta ao clube do coração, “aquele gol de Pontoni!”.