Você já ouviu falar em psiquiatria de precisão? Ela propõe tratar cada paciente de forma mais personalizada, considerando suas características biológicas — e não apenas os sintomas. Para isso, utiliza informações do próprio corpo, como exames de imagem, testes genéticos e marcadores sanguíneos, que ajudam a orientar decisões mais precisas e seguras.
Durante muito tempo, os transtornos mentais foram tratados com base em sintomas, histórico do paciente, protocolos clínicos e experiência médica. Ainda que existam critérios diagnósticos e terapêuticos bem definidos, há certo grau de imprevisibilidade, já que os recursos atuais não mostram com precisão quais mecanismos cerebrais estão envolvidos — nem como o organismo de cada pessoa pode reagir aos tratamentos. A psiquiatria de precisão vem justamente para somar: oferecer pistas biológicas que ajudam a refinar condutas.
Quando o cérebro mostra o caminho
Exames como a ressonância magnética funcional (fMRI) e a tomografia por emissão de pósitrons (PET) permitem observar o cérebro em tempo real. Eles mostram a atividade de diferentes regiões e ajudam a diferenciar transtornos com sintomas parecidos, como depressão e transtorno bipolar. Revelam, por exemplo, que cada transtorno afeta o cérebro de uma forma específica. Embora ainda não façam parte da prática clínica rotineira, esses recursos têm contribuído para pesquisas que aproximam o diagnóstico da compreensão do funcionamento cerebral.
Pistas no sangue
O sangue também pode trazer informações valiosas. Pesquisadores estudam biomarcadores como o BDNF — um fator que estimula o crescimento e a sobrevivência dos neurônios — e substâncias inflamatórias como a interleucina-6 (IL-6) e a proteína C reativa (PCR), que costumam estar alteradas em condições como a depressão e a esquizofrenia.
Esses exames ainda não fazem parte da prática clínica, mas futuramente podem ajudar a guiar o tratamento. Por exemplo, diante de um processo inflamatório, o médico pode considerar um remédio que também atue na inflamação. Além disso, esses biomarcadores ajudam a entender como o corpo reage ao tratamento, permitindo ajustes mais rápidos e cuidadosos. Em alguns casos, podem até sinalizar a necessidade de mudanças antes mesmo do aparecimento de sintomas clínicos.
Quando os genes ajudam a decidir
Os testes genéticos fazem parte da farmacogenética. Eles analisam variações em genes que influenciam como o organismo processa certos medicamentos. Assim, é possível prever se a pessoa tende a metabolizar um remédio de forma muito rápida, lenta ou dentro do esperado.
Esses testes ajudam a evitar escolhas com maior risco de efeitos adversos ou de baixa eficácia. Genes como CYP2D6 e CYP2C19 influenciam diretamente nas decisões sobre dose e escolha do medicamento, trazendo mais segurança e precisão ao tratamento.
O futuro é cuidar de cada um como único
A psiquiatria de precisão ainda está em desenvolvimento, mas já representa um avanço na forma de diagnosticar e tratar os transtornos mentais. Ela não substitui o diagnóstico clínico — base da prática médica — nem o olhar atento e humano do profissional, tampouco sua experiência clínica. Mas se alia à ciência para tornar o cuidado mais seguro, individualizado e sensível à singularidade de cada pessoa.
*Texto escrito pela psiquiatra Daniela Londe (CRM 15813 / RQE 12962), doutora pela Universidade Federal de Goiás (UFG), professora no curso de Medicina da UNIFIMES e membro da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP)
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Este conteúdo foi originalmente publicado em Psiquiatria de precisão: conheça o futuro do tratamento em saúde mental no site CNN Brasil.
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