O psicólogo social Jonathan Haidt, autor do livro A Geração Ansiosa, alertou para os riscos crescentes daquilo que chama de “infância digital desprotegida”, resultado da exposição precoce a plataformas como TikTok, Instagram e YouTube — não apenas como usuários, mas também como produtos ofertados ao mercado publicitário.
“Nós não somos o cliente dessas plataformas. Somos o produto. Os clientes são os anunciantes. E quando os pais colocam seus filhos para atuar como influenciadores, o que estão fazendo, na prática, é vender a atenção das crianças para esses anunciantes”, afirmou Haidt, que participou do CNN Entrevistas desta semana.
O fenômeno dos “mini influenciadores” — crianças com milhares ou até milhões de seguidores — é celebrado em muitas famílias como oportunidade de sucesso precoce. Mas, para Haidt, essa é uma lógica perversa.
“Não é um jeito inocente de se ganhar dinheiro. Devemos ser contra. Isso deveria ser ilegal. Você recebe dinheiro ao vender seu filho. É isso o que está acontecendo”, diz o psicólogo, uma das vozes mais influentes da atualidade no debate sobre os impactos das redes sociais na saúde mental de crianças e adolescentes.
De passagem pelo Brasil, onde participa do evento Fronteiras do Pensamento, Haidt defende que seja estabelecida uma idade mínima legal para que crianças atuem como influenciadores digitais, como forma de protegê-las da lógica comercial que permeia a chamada economia da atenção — um modelo de negócios baseado em capturar o tempo e o foco das pessoas, especialmente dos mais jovens.
Além da exposição à publicidade, Haidt aponta outro efeito colateral ainda mais preocupante: a destruição da capacidade de concentração. Em suas palavras, trata-se do maior mal causado por essa infância hiper conectada.
“Se você não consegue se concentrar por 30 minutos sem interrupção, você não consegue fazer nada neste mundo. Não terá utilidade a ninguém”, disse à CNN.
A afirmação vai além de um alerta comportamental: é um diagnóstico de impacto educacional, cognitivo e econômico. Para o psicólogo, uma geração inteira está sendo formada com menor capacidade de foco, o que pode comprometer seu desempenho escolar, sua autonomia profissional e até a produtividade futura das sociedades. “Tenho medo de como isso vai afetar as crianças, a economia, e tudo mais”, disse ao CNN Entrevistas.
Diante desse cenário, Haidt propõe uma combinação de medidas estatais e sociais.
Ele elogia países como Austrália — que aprovou lei exigindo verificação de idade mínima de 16 anos para abrir contas em redes sociais — e o Brasil, que neste ano proibiu o uso de celulares em escolas públicas e privadas durante as aulas e os intervalos.
Mas adverte que as leis sozinhas não bastam.
É preciso que pais, escolas e comunidades criem normas sociais conjuntas, que estabeleçam limites de acesso e uso das telas desde a infância.
No livro que está entre os mais vendidos no mundo por mais de um ano, Haid, apresenta quatro propostas para conter os danos causados pelas redes sociais.
As duas primeiras medidas, segundo ele, exigem regulação governamental. Já as demais, dependem de um pacto social entre famílias — algo que, acredita, pode unir até mesmo países divididos politicamente.
“Republicanos e democratas têm filhos. Apoiadores do Lula e do Bolsonaro também. Nunca houve um momento em que todos os pais do mundo enfrentassem o mesmo inimigo.”
A fala de Haidt ecoa como um alerta global.
Enquanto crianças e adolescentes têm suas rotinas moldadas por algoritmos e sua atenção disputada por anúncios, o psicólogo nos convida a refletir: quem está educando nossos filhos? As famílias ou as plataformas?
Para ele, a resposta a essa pergunta define não apenas o bem-estar emocional das futuras gerações, mas o próprio futuro da sociedade.