O mês de abril representou um ponto de inflexão para o mercado brasileiro de trigo. Segundo o analista e consultor da Safras & Mercado, Elcio Bento, o período iniciou com um viés altista, sustentado por fatores como escassez de produto no mercado interno e valorização do dólar. Contudo, os últimos dias do mês trouxeram uma reviravolta: o otimismo cedeu lugar à pressão baixista, impulsionada pela queda nas cotações internacionais e pela crescente competitividade do trigo argentino.
No início de abril, predominava entre os vendedores uma expectativa de valorização. De acordo com Bento, o cenário parecia promissor para os produtores, uma vez que o mercado apresentava oferta limitada, o câmbio havia alcançado R$ 6,10 e os preços internacionais ainda ofereciam certo suporte. Esses elementos favoreciam o lado vendedor na definição dos preços.
O otimismo inicial, porém, foi desfeito com a entrada de ofertas mais competitivas do trigo argentino. A região Sul, especialmente o Rio Grande do Sul — principal detentora dos estoques internos —, passou a registrar as primeiras indicações de importação com valores próximos à viabilidade econômica. “Essas ofertas começaram a mudar o sentimento do mercado, porque traziam uma alternativa concreta à compra no mercado doméstico”, explica Bento.
Outro fator determinante para a mudança de humor no mercado foi o forte recuo das cotações internacionais, especialmente nos Estados Unidos, que impactaram diretamente os preços argentinos. Embora o Brasil compre majoritariamente da Argentina, a concorrência com o trigo norte-americano força os argentinos a ajustarem seus valores. “Com a queda de lá, a Argentina precisou acompanhar, e isso afetou diretamente nossa paridade de importação”, detalha o analista.
A valorização do real ao longo de abril também colaborou para baratear as importações. Embora o câmbio continue volátil, a moeda brasileira mais forte contribuiu para a perda de competitividade do trigo doméstico. “O que vimos foi uma transição de um mercado em que o vendedor ditava o ritmo, para um cenário onde o comprador passou a ter mais argumentos para pressionar os preços para baixo”, resume Bento.
A mudança de percepção também se refletiu no comportamento dos agentes. O produtor, antes resistente à venda, passou a demonstrar maior disposição para negociar. Em contrapartida, a ponta compradora adotou uma postura mais cautelosa. “Agora é o comprador que está na defensiva, exigindo preços mais baixos e empurrando o mercado para baixo”, complementa o analista.
Apesar de os preços ainda acumularem certa alta em relação a março, o que se observa é uma tendência de enfraquecimento, especialmente nas cotações do final do mês. Para Bento, mais do que os valores em si, o sentimento dos agentes é o principal indicador do novo rumo do mercado.