A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que autoriza o estado de Mato Grosso a restringir benefícios fiscais e doações de terrenos públicos para empresas que aderem à moratória da soja e da carne a partir de 1º de janeiro de 2026, gerou reações positivas entre os produtores rurais. A medida é vista como uma vitória no reconhecimento do direito do estado em incentivar a observância da legislação ambiental brasileira, sem depender de acordos privados.
A decisão, proferida pelo ministro Flávio Dino, representa um marco para a autonomia de Mato Grosso na formulação de políticas públicas de incentivo econômico. A medida reflete a postura do estado em fomentar a atividade de produtores rurais que operam conforme as normas do Código Florestal Brasileiro, garantindo maior segurança jurídica aos agricultores da região.
De acordo com Ieda Queiroz, advogada e coordenadora do setor de agronegócios do CSA Advogados, “A Lei Mato-grossense visou trazer segurança aos produtores rurais da região que operam conforme as normas do Código Florestal, deixando clara a posição do Estado em favor dos produtores regulares e fazendo uso de suas atribuições para coibir o acesso a benefícios estaduais a empresas que exijam a observância de critérios superiores ao previsto na legislação nacional.”
A Moratória da Soja é um acordo privado criado por empresas do setor de exportação de soja e derivados. Os signatários do acordo comprometem-se a não adquirir soja de áreas localizadas no bioma amazônico que tenham sido desmatadas após 22 de julho de 2008, data que marcou o início das discussões sobre a revisão do Código Florestal Brasileiro.
Este acordo surgiu em 2006 após o relatório do Greenpeace, intitulado “Eating up the Amazon”, que apontou a expansão da soja na região amazônica como principal responsável pelo aumento do desmatamento no bioma. Entre 2002 e 2008, o desmatamento na região alcançou a marca de 10,6 mil km² por ano. Contudo, após a adoção da moratória e com a implementação do Código Florestal entre 2009 e 2014, a taxa de desmatamento foi reduzida para 3 mil km² por ano.
Segundo Ieda Queiroz, tanto a Moratória da Soja quanto o relatório do Greenpeace desempenharam papéis cruciais na construção dos parâmetros que serviram de base para a criação do Código Florestal Brasileiro, sancionado em 2012. “A Moratória e o relatório do Greenpeace foram importantes para iniciar a discussão sobre os critérios que mais tarde foram transformados no Código Florestal, que passou a incorporar medidas obrigatórias de conformidade ambiental para os produtores rurais”, explica.
A partir de então, a regularização ambiental passou a ser parte essencial da agenda dos produtores rurais. Entre as exigências estabelecidas pelo Código Florestal, destacam-se o georreferenciamento das propriedades e a obrigatoriedade de destinar uma parte da área para preservação ambiental, além da preservação de áreas de preservação permanente, como nascentes e margens de rios.
A advogada Ieda Queiroz afirma que a Moratória da Soja, por ser um acordo privado e não uma norma legal formalizada, não foi incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro. “A Moratória não é uma lei ou ato normativo, tampouco um tratado internacional, já que não envolve compromisso entre Estados e Governos”, explica.
Ela também reforça que a decisão do estado de Mato Grosso não impede que as empresas operem, mas visa restringir os incentivos fiscais e benefícios a aquelas que não atendem aos critérios estabelecidos pela legislação nacional. “Mato Grosso não está proibindo as empresas de funcionarem, mas sim restringindo os benefícios fiscais a aquelas que não cumprem a legislação ambiental. Isso é justificável em um estado com forte presença agrícola e que faz parte do bioma amazônico”, conclui Ieda Queiroz.
A decisão do STF fortalece o compromisso de Mato Grosso com a legislação ambiental, refletindo uma postura de incentivo à regularização dos produtores rurais e alinhamento com as normas do Código Florestal Brasileiro. Enquanto a Moratória da Soja segue como um acordo privado, a autonomia do estado em estabelecer critérios próprios de incentivo econômico é vista como uma estratégia essencial para garantir a sustentabilidade e a conformidade ambiental no setor agrícola.