O comprador norte-americano médio de automóveis não pensa na origem das peças que fazem o seu veículo, mas as montadoras pensam nisso.
É por isso que uma nova rodada de tarifas automotivas — desta vez sobre peças — entrará em vigor neste sábado (3) e poderá mudar o setor de montadoras nos Estados Unidos, ainda mais do que as taxas anteriores sobre carros importados.
Desde àss 01h01 (horário de Brasília) deste sábado, a maior parte das importações de autopeças aos EUA estará sujeita a um imposto de importação de 25%.
As tarifas automotivas anteriores não afetaram os carros fabricados nos EUA. Isso mudou. Nenhum dos 10 milhões de carros produzidos pelas fábricas dos EUA no ano passado foi fabricado sem pelo menos algumas peças importadas. As tarifas sobre peças podem agora significar dezenas de bilhões de dólares em novos custos para o setor e, eventualmente, para os compradores e proprietários de carros americanos.
“Francamente, do meu ponto de vista, as tarifas sobre peças parecem piores para a economia em geral do que as tarifas sobre veículos importados”, disse Jonathan Smoke, economista-chefe da Cox Automotive, em um webinar da Automotive Press Association na semana passada.
Mais de 50% do conteúdo dos carros montados nas fábricas de automóveis norte-americanas é importado, de acordo com estimativas do próprio governo. Mas as tarifas não se aplicarão igualmente a todas essas importações.
Por exemplo, as peças de fornecedores canadenses ou mexicanos que pagam aos seus trabalhadores US$ 16 ou mais por hora são consideradas “compatíveis” com o Acordo EUA-México-Canadá, um acordo comercial negociado durante o primeiro governo Trump. Isso significa que a maioria das peças canadenses está isenta de tarifas, ao contrário de relativamente poucas peças mexicanas.
E, desde a semana passada, as montadoras que fabricam carros nos Estados Unidos podem compensar parte da tarifa das peças, pelo menos temporariamente. A Casa Branca disse que reembolsaria as montadoras em até 3,75% do preço do veículo em relação às tarifas de peças no primeiro ano, caindo para 2,5% no segundo ano antes de serem eliminadas gradualmente no terceiro ano.
Mas, mesmo com esse reembolso, o custo adicional das tarifas ainda pode chegar a uma média de cerca de US$ 4.000 por veículo, de acordo com estimativas derivadas de uma análise da CNN de dados comerciais do governo.
Os compradores de automóveis podem demorar um pouco para perceberem os aumentos de preços. A CEO da General Motors, Mary Barra, disse à CNN na quinta-feira (1) que as tarifas custarão à sua empresa entre US$ 4 bilhões e US$ 5 bilhões este ano, mas ela não espera que os preços dos carros mudem no curto prazo.
O CEO da Ford, Jim Farley, disse à CNN na quarta-feira (30) que estenderia sua oferta de “preços para funcionários” até 4 de julho.
Mas os americanos comuns ainda verão preços mais altos em outros lugares, como nas oficinas mecânicas.
“As tarifas sobre peças levarão a uma inflação mais alta em reparos, manutenção e seguro, o que afeta todos os americanos e não apenas as pessoas que estão pensando em comprar um novo veículo importado”, disse Smoke.
A recente mudança nas regras de tarifas de peças significa que qualquer carro montado nos Estados Unidos com 85% de peças em conformidade com o USMCA (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio, em tradução livre) estaria essencialmente livre de tarifas.
O problema é que praticamente nenhum veículo atende a esse limite de 85%, de acordo com a análise de Frank DuBois, professor aposentado da Kogod School of Business da American University.
Isso ocorre porque as montadoras vêm operando há décadas como se a América do Norte fosse um mercado único, movendo peças repetidamente através das fronteiras dos EUA com o Canadá e o México com poucas ou nenhumas tarifas.
Julgar qual conteúdo é de fato nacional também pode ser difícil, disse DuBois, chegando a pontos tão pequenos como a origem do óleo e do anticongelante.
Além dos US$ 19,2 bilhões em componentes canadenses importados, a maioria das outras peças importadas não será isenta.
Por exemplo, o México enviou US$ 82,5 bilhões em peças para os Estados Unidos no ano passado, de longe a maior fonte de peças importadas. Mas poucas delas são consideradas compatíveis com o USMCA; portanto, a maioria terá a tarifa anexada.
Se as tarifas atuais para autopeças (e taxas adicionais para produtos chineses em geral) estivessem vigentes no ano passado, o preço total teria sido de cerca de US$ 60 bilhões. Mesmo com as regras de reembolso anunciadas na semana passada, esse valor só teria caído para US$ 40 bilhões.