19/05/2025 - 17:19
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Livro expõe a vida secreta de padres gays na Igreja Católica

A expressiva presença de homens gays em ordens e congregações da Igreja Católica expõe uma das maiores contradições de uma das instituições mais antigas do mundo.

Embora historicamente mantenha posturas conservadoras em relação à comunidade LGBTQIAP+, a Igreja também é composta por membros que vivem, muitas vezes em silêncio, realidades que desafiam essas diretrizes. É o que mostra A Vida Secreta dos Padres Gays — Sexualidade e Poder no Coração da Igreja (Matrix Editora).

Assinado pelo o especialista em sexualidade e religião e ex-seminarista Brendo Silva, o livro traz vivências pessoais do autor e mergulha em um tabu amplamente conhecido nos bastidores sacerdotais, mas que raramente chega ao debate público.

Brendo começou a notar essa ambiguidade ainda na infância, quando era coroinha e percebeu que a maioria dos meninos ao seu redor era gay. A mesma impressão se repetiu no vocacional e no seminário onde viveu por quatro anos. Segundo ele, já no vocacional, adolescentes entre 12 e 14 anos trocavam cantadas e até mantinham relações. No seminário, afirma que, entre os 12 seminaristas da turma, pelo menos oito se relacionavam com outros homens.

“Sempre foi uma situação muito banal e corriqueira. Não é novidade no meio da igreja que isso existe. Só não é falado, é tabu”, diz o escritor.

Silva explica que, dentro da igreja, há diferentes grupos de ideológicos, o que inclui vertentes progressistas e outras mais conservadoras. Cada grupo vai lidar com a homossexualidade de maneira diferente.

Em seminários considerados mais progressistas, é comum que os integrantes tenham certa liberdade para viver sua sexualidade — desde que com discrição. A orientação implícita é evitar qualquer “escândalo”, ou seja, situações que façam com que membros da paróquia tomem conhecimento da vida afetiva dos seminaristas.

Autor de livro sobre padres gays- Metrópoles
Autor de livro sobre padres gays

“Já em um seminário mais conservador, apesar de ser formado majoritariamente por homossexuais, há uma repressão à sexualidade”, conta Brendo, que lembra da própria experiência:

“Eu morei em um seminário de linha mais carismática, portanto, conservador, em que os gays passavam por um tratamento de ‘cura gay’. Eu fui um desses. E as pessoas que me colocavam nesse tratamento eram outros gays.”

O corporativismo dentro da instituição seria o motivo da vista grossa em vários situações que envolvem a sexualidade de clérigos. Uma denúncia de má conduta conforme o direito canônico dificilmente é levada a frente, de acordo com Breno. “Porque o superior também tem vida dupla. É um sistema corrompido e imoral. No púlpito é pregado uma coisa, que no off é quase nunca vivida. O celibato fica muito numa esfera romântica”, analisa.

Contribuições

Além do corporativismo, o acolhimento de homens gays dentro da instituição também tem a ver com as contribuições que esses clérigos dão à instituição eclesiástica, que se beneficia dos padres gays, fundamentais para a manutenção da liturgia, da arte sacra, dos estudos teológicos e da organização interna.

“Um clero sem gays descaracterizaria a Igreja Católica. A questão estética, litúrgica, a música, a arte sacra, os estudos etc. Como ficaria tudo isso sem os padres gays? Existiria Igreja Católica somente com padres heterossexuais? É praticamente impossível imaginar. Os gays mantêm essa Igreja viva”, diz o autor em uma passagem do livro. Essa ambiguidade ainda evitaria um êxodo em massa de religiosos, segundo a publicação.

A obra traz ainda depoimentos de 16 homens — gays e heterossexuais — que passaram por seminários, conventos e casas paroquiais, ou que ainda vivem nessas instituições. Entre os relatos, estão padres em atividade, ex-seminaristas, religiosos que deixaram a vida clerical e um seminarista, de diferentes congregações e dioceses. Os testemunhos revelam como a homossexualidade está presente no cotidiano da Igreja, sendo vivida de formas distintas — da repressão à exposição aberta.

Saída

Brendo Silva teve vida dentro da Igreja Católica dos 14 aos 21 anos. Chegou ao seminário maior, quando estudava filosofia na Europa.

“Decidi pedir para sair porque não achava honesto levar vida dupla, como quase todos os padres e seminaristas que convivi e conheci morando em vários estados e até fora do país. Vivia numa eterna crise entre discurso e prática. Além disso, se você não ‘entra’ nesse sistema, você pode ser até perseguido. Era uma vida que estava perdendo o sentido para mim. Busquei ser minimamente autêntico saindo dali”, revela.

O autor ainda diz que a publicação é uma forma de fazer justiça com sua própria história, além de dar voz a padres e seminaristas gays, a fim de que a igreja os trate com humanidade.

“A Igreja precisa ser curada de sua própria homofobia, do seu auto ódio. É a instituição que mais pauta a moral da sociedade, mas quando a sociedade vai pautar a sexualidade da Igreja?”, questiona.

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